Reflexão da Liturgia Dominical
Marcos 10,17-30 narra a cena de “alguém” rico (Mateus
19,22 diz um jovem, Lucas 18,18, um líder de alta posição) que faz uma pergunta
fundamental: o que fazer para ganhar a vida eterna? Jesus apresentou como
caminho de salvação o cumprimento dos mandamentos e o desprendimento dos bens
temporais: “Vai, vende tudo o que tens e dá aos pobres, e terás um tesouro no
céu. Depois vem e segue-me!” (Mc 10,21).
Como era possuidor de bens, o interlocutor foi embora
“cheio de tristeza”. A seguir, Jesus voltou-se para os discípulos e falou da
dificuldade de um rico entrar no Reino de Deus. “É mais fácil um camelo passar
pelo buraco de uma agulha do que um rico entrar no Reino de Deus” (Mc 10,25),
afirmou o Mestre. Ele alertou que o apego às coisas impede a entrada no
Reino.
Mas para Deus tudo é possível. Pedro entrou em cena e
disse a Jesus: “Eis que nós deixamos tudo e te seguimos”. Ele respondeu: “Em
verdade vos digo, quem tiver deixado casa, irmãos, irmãs, mãe, pai, filhos,
campos, por causa de mim e do Evangelho, receberá cem vezes mais agora, durante
esta vida – casa, irmãos, irmãs, mães, filhos e campos, com perseguições – e,
no mundo futuro, a vida eterna” (Mc 10, 29-30).
Quem age conforme a catequese de Jesus, é sábio. A Sabedoria
é conhecê-lo por meio do Espírito, e através dele, o Pai.
É Deus quem concede a sabedoria e a prudência. Guardar os
seus mandamentos é estar no bom caminho (Pr 2,1-9).
“Preferi a Sabedoria aos cetros e tronos e em comparação
com ela, julguei sem valor a riqueza” (Sb 7,8). Buscar a Sabedoria, é buscar o
bem maior que dá sentido à nossa vida, é buscar o próprio Deus. Ter a Ele é
possuir tudo.
Aprendemos essa sabedoria com os santos: o que vale é
conhecer o amor de Cristo, “que ultrapassa todo conhecimento”, para que sejamos
“repletos da plenitude de Deus”. Nossa riqueza é Cristo habitando em nossos
corações pela fé e que sejamos enraizados e bem firmados no amor (Ef 3,14-19).
No início do itinerário dos Exercícios Espirituais, Santo
Inácio de Loyola apresenta o Princípio e Fundamento (EE, 23), uma espécie de
resumo do projeto criador de Deus, que expressa o sentido último de toda a vida
humana: o caminho da salvação consiste em louvar, reverenciar e servir a Deus
nosso Senhor. Todas as coisas foram criadas para nos ajudar a atingir esse fim.
Devemos usar delas “tanto quanto” nos ajudam, ou privar-nos delas “tanto
quanto” nos impedem de atingir esse fim. Inácio fala da indiferença diante das
coisas. Devemos desejar e escolher “somente aquilo que mais nos conduz ao fim
para o qual somos criados”.
A fonte da vida é Deus. Seguir a Jesus supõe um coração
livre de apegos e afeições desordenadas. Vender tudo é renunciar o que
atrapalha o nosso seguimento. Por Jesus e pelo Reino, vale a pena vender
tudo, pois teremos um tesouro no céu.
Dom Paulo Roberto Beloto, Bispo Diocesano.
(Imagem: Jovem Rico. Heinrich Hoffmann. Século XIX)