Reflexão da Liturgia Dominical
No 5º domingo da Quaresma lemos e meditamos João 8,1-11. A cena traz
traços semelhantes à linguagem de Lucas. Estamos diante de um fato premeditado
pelos mestres da lei e fariseus: queriam apanhar Jesus em contradição para
poderem acusá-lo. Segundo a Lei de Moisés (Dt 22,22; Lv 20,10), uma mulher e um
homem surpreendidos em adultério teriam como pena a morte.
No caso apresentado, a mulher já tinha a sua sentença decretada.
Dependendo da sua resposta à pergunta dos mestres da lei e fariseus, Jesus
poderia cair em contradição. Se concordasse com as prescrições da Lei,
estaria negando a sua prática de amor, se fosse contrário ao apedrejamento,
negaria a Lei e poderia ser condenado. A sua reação desarma escribas e
fariseus. A resposta e as palavras à mulher revelam o sentido da sua missão.
Jesus veio para salvar. O Pai não quer a morte do pecador, mas a sua
conversão e a sua vida: “Eu também não te condeno, podes ir, e de agora em
diante não peques mais” (v.11). A mulher não é condenada, mas convidada a
buscar uma vida nova.
Os escribas e fariseus eram fiéis observantes da Lei, mas muito rígidos.
Para eles, os pecadores deveriam ser castigados. Não aceitavam a prática de
compaixão de Jesus como princípio de vida, de julgamento e de relacionamento
social.
Jesus é a revelação da misericórdia do Pai. Veio em busca da humanidade
ferida para curar e salvar: perdoa e revela que o Pai é misericordioso. É um
amor gratuito que transforma a situação de exclusão e condenação e salva os
seus filhos.
A misericórdia de Deus abre caminho para a conversão. Só Ele pode
libertar do pecado, é iniciativa sua a nossa salvação. A sua graça realiza em
nós uma nova condição.
A vida ensina que nos afastamos do caminho de Deus, vítimas do pecado.
Estamos naturalmente inclinados ao mal, fechados em nós mesmos, incapazes de
corresponder ao amor de quem tanto nos ama. Somos pecadores e reconhecemos a
nossa miséria, mas confiamos na redenção e remissão dos pecados. Foi Deus “que nos
livrou do poder das trevas, transferindo-nos para o reino do seu Filho, no qual
temos a redenção, o perdão dos pecados” (Cl 1,13-14).
O pecado é recusar a comunhão de vida e de amor com Deus e com os
irmãos. É uma experiência que nos afasta da caridade e nos priva da graça
santificante. Há a necessidade de uma nova iniciativa da misericórdia divina,
da conversão do coração e da confissão. O estado de graça é recuperado mediante
arrependimento e o perdão.
A consciência do pecado nasce da experiência do amor de Deus, que nos
amou e nos escolheu “antes da fundação do mundo, para sermos santos e íntegros
diante dele, no amor” (Ef 1,4). Esta descoberta nos leva a reconhecer-nos
pequenos, limitados e pecadores, mas confiantes e abertos à conversão.
Jesus perdoa e nos ensina também a perdoar e a celebrar o perdão. Ele
confiou a obra de reconciliação à Igreja (Jo 20,22-23; 2 Cor 5,18), entregou a
ela, na pessoa de Pedro, as chaves do Reino dos céus, para dizer o poder de
atar e desatar os pecados.
Quem perdoa é Deus. A Igreja é mediadora da reconciliação, é depositária
e dispensadora do perdão. O poder do sacerdote é ministerial, brota do caráter
sacerdotal, absolvendo os fiéis “in persona Christi”.
Pedimos perdão e o oferecemos aos outros. Ele é fundamental nos relacionamentos humanos. Não é possível uma convivência fraterna sem a prática sincera do perdão É o remédio para curar as feridas do coração. É um atributo dos fortes, a condenação, dos fracos. É um ato de fé que nos leva a acolher a vida nova (Is 43,19), que consiste em “conhecer a Cristo, experimentar a força da sua ressurreição” (Fl 3,10). A fé é uma abertura que leva a perdoar e a amar, a acreditar na justiça divina. O cristão é como um atleta em busca do prêmio, que é Jesus.
Dom Paulo Roberto Beloto, Bispo Diocesano.