Reflexão da Liturgia Dominical
João 13,31-33ª.34-35 faz parte do conhecido “Livro da
Glorificação” (Jo 13-17). É um conjunto de orientações e exortações de Jesus
aos “seus”. No contexto da celebração da ceia com os Doze, no cenáculo, Ele
realizou um gesto desconcertante, lavando os pés dos discípulos. Foi um ato de
amor e humildade: Jesus amou, servindo. Após o gesto, temos uma espécie de
catequese com vários assuntos, com as últimas lições do Mestre, através de
palavras marcadas pela intimidade, ditas num clima de discrição e contemplação.
No centro de tudo está o mandamento novo: a prática do amor.
Na passagem indicada na liturgia, Jesus falou de sua
glorificação: “Agora foi glorificado o Filho do Homem, e Deus foi glorificado
nele. Se Deus foi glorificado nele, também Deus o glorificará em si mesmo, e o
glorificará logo” (Jo 13,31-32). A glória de Jesus é a revelação do projeto de
Deus. Nele, o Pai revela a sua vontade aos seres humanos. A glória do Filho se
manifesta no mistério pascal, na sua entrega fiel e obediente, morrendo na
cruz. O Pai o ressuscitou pelo poder do Espírito.
“Eu vos dou um novo mandamento: amai-vos uns aos outros.
Como eu vos amei, assim também vós deveis amar-vos uns aos outros” (Jo 13,34).
Jesus foi glorificado porque amou os “seus que estavam no mundo até o fim” (Jo
13,2).
João é conhecido como o “discípulo que Jesus amava” (Jo
13,23; 19,26. O tema do amor é constante no seu Evangelho, mas aparece somente
a partir do capítulo 13, antes da cena do lava-pés: “Tendo amado os seus que
estavam no mundo, amou-os até o fim” (Jo 13,1). A partir do gesto, temos uma
forte catequese sobre o mandamento novo, que continua nas cartas.
O amor é um aprendizado, e Jesus é o professor. Ele nos
ensina o que é o amor e o que é amar. O gesto do lava-pés é uma indicação
de que o amor é expressão do serviço.
Jesus amou os discípulos com o mesmo amor divino que o
Pai tem por ele. Este amor deve caracterizar os seus seguidores. O amor das
pessoas divinas pelos discípulos gera a possibilidade dos mesmos amar a Deus e
amarem-se reciprocamente.
O amor não é só sentimento, simpatia e emoção. É o amor teologal,
divino, que desce do Pai para o Filho e para nós, através do Espírito, e nos
une como irmãos. Na prática do amor, os discípulos revelam-se como seguidores
de Jesus (Jo 13,15).
Características do amor fraterno: serviçal - o lava-pés é
a crucificação na vida diária, como Jesus lavou os nossos pecados, devemos
lavar as decepções, os fracassos e as crises dos irmãos. A novidade do
mandamento deixado por Jesus é amar como ele amou, oferecendo a vida, servindo
gratuitamente. Amor permanente - até o fim, amar no sacrifício. O amor é
comunitário - não exclui ninguém.
Atos 14,21b-27 narra a conclusão da primeira viagem
missionária de Paulo e Barnabé. Esses apóstolos encorajam os discípulos e os
exortam a ficarem firmes na fé, mesmo diante das tribulações e das oposições ao
projeto de Deus. A perseverança revela a fidelidade a Deus.
Em Apocalipse 21, João descreveu como será o fim, o que
Deus preparou para aqueles que o amam. Esse “fim de caminhada” é dom de Deus e
fruto da fidelidade e perseverança dos cristãos. Irão participar aqueles que
têm o nome escrito no “Livro da vida do Cordeiro”. O futuro é descrito através
de imagens: “novo céu e nova terra” (v.1), “nova Jerusalém” (v.2), “noiva
enfeitada para o seu esposo” (v.2), “nova aliança” (v.3), “novas todas as
coisas” (v.5) ... Enfim, o futuro é o próprio Deus que vem morar no meio
do seu povo, enxugando “toda lágrima dos seus olhos” (v.4). Ele é a luz que
brilha sobre nós. E Jesus, o Cordeiro, a lâmpada.
Vendo a realidade do mundo de hoje, com tantos desafios,
violências, injustiças, sofrimentos, miséria humana, lamentos, choros e
lágrimas, tomamos consciência que temos um longo caminho a percorrer. O futuro
descrito no livro do Apocalipse alimenta a fé e a esperança. O remédio é a
vivência do amor, mandamento novo deixado por Jesus, como fruto do Espírito e
esforço humano.
O mundo marcado pelo desamor já foi reconciliado por
Cristo, aconteça o que acontecer. Às vezes dá a impressão que Jesus perdeu e o
inimigo venceu. Mas não é verdade. A sua paixão já redimiu o mundo, pois o amor
é mais forte do que o ódio. Temos que manter essa fé e acreditar na vitória de
Cristo sobre o mal. No final das contas, o mal é um vazio, uma mentira, uma
ilusão. O real é o amor de Jesus.
Alimentos para a prática do amor fraterno: Espírito Santo, Palavra de Deus e os sacramentos. Na Eucaristia intensificamos a vida espiritual e o nosso apostolado. Beber e comer do amor divino é o que nos fortalece na vida espiritual e nos capacita para a missão.
Dom Paulo Roberto Beloto, Bispo Diocesano.