Dom Paulo Roberto Beloto escreve sobre a Missa Crismal, que é celebrada na manhã da Quinta-feira da Semana Santa.
A Missa que o Bispo concelebra com o seu
presbitério e dentro da qual consagra o santo crisma e benze os outros óleos, é
chamada de Missa Crismal. Ela expressa a comunhão dos presbíteros com o Bispo.
Na confecção do crisma, os padres são testemunhas e cooperadores do Bispo, de
cujo múnus sagrado participam, na edificação, santificação e condução do povo
de Deus. Cada padre renova as promessas feitas perante o bispo e o povo,
confirmando os compromissos sacerdotais, assumidos na ordenação.
O sacerdócio ministerial tem uma relação
estreita e íntima com a Eucaristia. Ambos os sacramentos nasceram juntos e
estão indissoluvelmente ligados. Seguindo o Evangelho de João, destaco um fato
ocorrido no contexto da Última Ceia, com ligação íntima com a Eucaristia e o
sacerdócio: o lava-pés. Jesus “levantou-se da ceia, tirou o manto, pegou uma
toalha e amarrou-a à cintura. Derramou água numa bacia, pôs-se a lavar os pés
dos discípulos, e enxugava-os com a toalha que trazia à cintura” (Jo 13,4-5). O
gesto de Jesus lavar os pés dos discípulos é desconcertante: ele prestou um
serviço de escravo, despojando-se de sua condição divina, revelando-se como
servidor.
Duas resistências às ações de Jesus: a
de Judas é mais séria. O diabo pôs no seu coração o propósito de entregar
Jesus. Tornou-se uma sombra ameaçadora, deixando-se levar pela ganância, cobiça
e autossuficiência. Não aceitou acolher a Deus e a pedagogia do seu amor. A
traição de Judas representa o pecado da humanidade que trai Deus e se fecha na sua
lógica. Pedro se opôs: “Senhor, tu me lavas os pés?” (Jo 13,6). Entendeu o ato
de Jesus no plano humano, teve dificuldade para acolher o caminho da cruz. Agiu
com falsa humildade e soberba, não acolhendo a misericórdia de Deus, em Jesus.
O lava-pés revela a pessoa de Jesus como
aquele que se ajoelha diante da humanidade, “lava e enxuga os nossos pés sujos
para nos tornar capazes de participar do banquete nupcial de Deus” (Joseph
Ratzinger, Bento XVI). Ele nos torna capazes de Deus. É um ato de serviço e de
purificação, o amor de Jesus que se reveste da nossa miséria, nos acolhe sem
condições prévias, nos purifica e nos torna aptos para amar e servir. O seu
gesto revela o sentido de nossa existência: enquanto criados no Verbo, nossa
missão é amar e servir. É preciso deixar que ele lave os nossos pés, que ele
nos purifique e santifique e nos ame, assim podemos nos aproximar de Deus e
fazer o que ele faz por nós aos irmãos. É o amor de Jesus que nos salva.
Precisamos, então, deixar que ele lave os nossos pés, deixar que ele nos ame.
Quando mergulhamos na sua misericórdia, o nosso coração encontrará o caminho
certo, e também podemos amar e servir.
Na Eucaristia celebramos o grande
acontecimento da Páscoa de Cristo, sua morte e ressurreição. O seu sacrifício
na cruz se faz presente de forma misteriosa e real na celebração eucarística. O
seu corpo e sangue são oferecidos para a remissão dos pecados. O gesto de Jesus
lavar os nossos pés, tem a sua plenitude na cruz e Eucaristia. Jesus fez de sua
vida uma oblação, um oferecimento, um serviço de amor que é celebrado na Ceia e
culmina na cruz.
O padre é homem da Eucaristia, na
celebração da santa Missa, o ministro age “in persona Christi”, deixa-se amar
por Jesus, vive sua intimidade com ele e se fortalece na prática das virtudes
necessárias para o exercício do seu apostolado. Jesus Cristo realiza o seu
ministério pelo ministério do presbítero. Há uma sintonia estrutural e
ontológica entre o Senhor, agente principal da Eucaristia, e o sacerdote, seu
ministro. No altar, o padre se une espiritualmente e afetivamente a Jesus
Cristo, experimenta-se cercado por ele, que se deixa tocar por suas mãos e se
comunicar com a assembleia por sua voz. São os mesmos interesses, as mesmas
atitudes e afetos, uma comunhão de vida entre aquele que se sente frágil, mas
fortalecido pela graça de Deus, mediador da doação eucarística, com o próprio
Jesus Cristo, alimento para os seres humanos. Na Eucaristia, o padre torna-se
um dom, apto para lavar os pés dos irmãos. Ele é na Igreja e no mundo um
sacrifício vivo, uma eucaristia com Jesus.
Dirijo-me aos padres, agradecendo a
vocação de cada um, a acolhida do dom do sacerdócio, o esforço na vivência da
comunhão, da amizade e da sinodalidade. Agradeço os serviços que realizam nas
paróquias, comunidades e atividades diocesanas. Aos fiéis, peço que rezem pelos
sacerdotes: é louvável que a comunidade interceda pela vida e ministério dos
presbíteros.
Dom
Paulo Roberto Beloto, Bispo
Diocesano.