"A lei do Senhor Deus é perfeita, conforto para a alma" (Sl 18,8).
João 2,13-25 narra a cena de Jesus no Templo de Jerusalém, expulsando
“os vendedores de bois, ovelhas e pombas e os cambistas que estavam ai
sentados” (Jo 2,14).
O Templo de Jerusalém era uma instituição
fundamental para a história de Israel, na sua dimensão religiosa,
política, econômica e social. Centro de encontro com Deus, através do
culto e adoração, lugar de muitas celebrações e sacrifícios,
principalmente nas grandes festas da Páscoa, Pentecostes e Tendas,
reunindo grande número de peregrinos.
O Templo possui uma
história de altos e baixos: sua origem vem desde o reinado de Salomão
(966-926 a.C.). Passou por uma reforma na época de Josias (641-610
a.C.), quando foi encontrado o livro da Lei, que serviu de referência.
Foi praticamente destruído quando os babilônios invadiram Jerusalém (587
a.C.). Com o retorno do exílio de famílias de judeus, em 538 a.C., sob a
direção de Zorobabel e Josué, foi incentivada a sua reconstrução. O
profeta Ageu também encorajou essa reconstrução (520 a.C.), servindo de
ponto de unidade do povo. O Templo ganhou dimensões magníficas no
período de Herodes (19 a. C.). Foi destruído no ano 70, pelos romanos.
Na
época de Jesus, o Templo tinha importância decisiva, como lugar de
reunião dos judeus, inclusive da Diáspora. Ali se concentravam os
impostos, dízimos, donativos, esmolas e demais ofertas. Segundo
historiadores, o templo era de certa forma um banco, que guardava o
dinheiro dos impostos e os bens das famílias mais ricas. Todo esse
tesouro servia para manutenção do local, como dos sacerdotes e outras
profissões.
Além do Templo de Jerusalém, houve durante a
história de Israel outros locais de cultos, como pequenos santuários. As
sinagogas eram locais de oração e leitura da Palavra de Deus. Quando os
judeus retornaram do exílio foi construído um templo no Monte Garizim,
para os samaritanos. Foi destruído em 128 a.C., mas a montanha continuou
sendo local de adoração e culto. Hoje restam as sinagogas em vários
locais do mundo, onde residem judeus e o Muro das Lamentações, lugar
sagrado do judaísmo, único vestígio do grande Templo de Jerusalém.
Há
várias referências nos evangelhos que relatam o relacionamento de Jesus
com o Templo de Jerusalém, desde a sua apresentação (Lc 2,22ss),
peregrinação com os pais por ocasião da Páscoa (Lc 2,41ss), até o ato
mais polêmico, que foi a expulsão dos vendedores e compradores (Mt
21,12-17); Mc 11,13-19; Lc 19,45-48: Jo 2,13-22)). Ele fez também a
profecia da sua destruição (Mt 24,1-14; Mc 13,1-13; Lc 21,5-19).
As
críticas de Jesus se concentram no desvio da finalidade do Templo, de
lugar de encontro com Deus, para lugar de lucro e negócios: “Não façais
da casa de meu Pai uma casa de comércio” (Jo 2,16).
“Destruí
este templo, e em três dias eu o levantarei... Jesus estava falando do
templo do seu corpo” (Jo 2,18.21). O gesto de purificação do templo de
Jerusalém é ocasião de revelação de outro lugar de culto, adoração e
encontro com Deus: o corpo de Jesus ressuscitado. “Quem quer adorar a
Deus em espírito e verdade deve fazê-lo em Cristo” (Missal dominical,
página 200). Ele é o novo templo, lugar de perfeito culto.
Há
lugares de encontros com Jesus Cristo ressuscitado: Sagrada Escritura,
Sagrada Liturgia, tendo a Eucaristia como “lugar privilegiado”, oração
pessoal e comunitária, pobres, aflitos e enfermos, piedade popular, na
“fé recebida e vivida na Igreja” (DAp, 246-275).
Na Igreja,
Cristo é o seu centro, a sua cabeça, a pedra fundamental, o alicerce. A
verdadeira Igreja é o corpo morto e ressuscitado de Jesus Cristo, fonte
de nossa pregação (1 Cor 1,23). Na Igreja somos pedras vivas, a
construção de Deus (1 Cor 3,9.16).
“Se alguém me ama, guardará
a minha palavra; meu Pai o amará, e nós viremos a ele e nele faremos a
nossa morada” (Jo 14,23). “Acaso não sabeis que sois santuário de Deus e
que o Espírito de Deus habita em vós?” (1 Cor 3,16). “Não sabeis que
vosso corpo é santuário daquele que habita em vós, o Espírito Santo que
recebestes de Deus e que não pertenceis a vós mesmos?” (1 Cor 6,19).
Santa Teresa de Jesus escreveu a obra “Castelo Interior” ou moradas, um
guia de viagem para se chegar ao interior da alma, onde se encontra o
castelo e nele mora um Rei. Nossa alma é um grande castelo composto de
moradas: o Senhor mora no mais íntimo da alma. Para ela, não há nada
mais grandioso, depois de Deus, do que o ser humano, na sua
interioridade. A alma é tão extraordinária que a inteligência humana
nunca será capaz de analisá-la completamente.
Se nosso corpo é
morada de Deus, a Ele pertence. Nos exercícios penitenciais da
Quaresma, a liturgia nos convida a expulsar de nós, principalmente do
nosso interior, aquilo que profana o templo de Deus, como egoísmo,
raiva, divisões, julgamentos, preconceitos, inveja, impurezas,
pensamentos ruins que dirigem nossos sentimentos e ações. É preciso, com
a graça de Deus, disciplinar e dirigir pela vontade, inteligência, amor
e a verdade as nossas emoções, sentimentos, afetos e as paixões,
re-ordenando tudo segundo a sua vontade. A ascese e a mortificação,
próprios de quem acolhe a santidade, não é negação da liberdade ou
dignidade humanas, mas um esforço, contando com a graça divina, de
orientar a vida, o tempo, os compromissos, as atividades, as
gratificações e tudo aquilo que constitui a vida humana, segundo o
Espírito, para o que fato educa, faz bem e agrada a Deus.
O que melhor agrada a Deus é cumprir os mandamentos, presentes no Decálogo (Ex 20,1-17), base da nossa vida moral, cujo centro é o amor (Mt 22,40). Quem ama a Deus e guarda os seus mandamentos é cumulado de misericórdia (Ex 20,6).
Dom Paulo Roberto Beloto,
Bispo Diocesano.