1º Domingo da Quaresma
"Não nos deixeis cair em tentação"
O primeiro domingo da Quaresma trata das tentações de Jesus, presentes nos três evangelhos sinóticos (Mt 4,1-11; Mc 1,12-13; Lc 4,1-13). O texto de Marcos é o mais enxuto neste relato. Logo após o seu batismo por João no rio Jordão (Mc 1,9), Jesus foi impelido pelo Espírito para o deserto, e ficou ali durante quarenta dias, e foi tentado por satanás. Vivia entre os animais e era servido pelos anjos.
O deserto é lugar árido, de carências de água, vegetação, alimentos, lugar de silêncio e solidão. Ali se experimenta a tentação de crises, de discernimento para a escolha daquilo que é essencial, mas é lugar de possibilidades, de encontro consigo e com Deus.
Quarenta é um número simbólico, indica um tempo de preparação e purificação, aparece várias vezes nas Escrituras, por exemplo: quarenta dias e quarenta noites durou o dilúvio (Gn 7,4.12.17); por quarenta anos o povo de Israel peregrinou no deserto (Nm 14,33; Dt 8,2; Sl 95,10); depois de ser alimentado pelo anjo do Senhor, o profeta Elias caminhou por quarenta dias e quarenta noites até o monte Horeb (1 Rs 19,8); obedecendo a palavra do Senhor, dirigida a ele pela segunda vez, o profeta Jonas foi a Nínive, e dizia: “Dentro de quarenta dias, Nínive será destruída” (Jn 3,4); após a sua ressurreição, Jesus “durante quarenta dias apareceu aos apóstolos” (At 1,3) .
Após a prisão de João, Jesus retornou à Galiléia, pregando o Evangelho de Deus e chamando à conversão (Mc 1,14-15).
Na Quaresma caminhamos durante quarenta dias, em preparação à celebração da Santa Páscoa. Iluminados pela Palavra de Deus, seguimos neste itinerário, chamados à conversão e a progredir na santidade. Iniciamos a nossa peregrinação na quarta-feira de cinzas, reconhecendo a nossa condição de pecadores e necessitados da graça e do perdão do Senhor. As semanas que seguem nos educam a caminhar com Ele. Converter-se é retornar a Deus: dependemos dele e do seu amor.
A Quaresma nos convida a um relacionamento mais intenso e profundo com Deus. Jesus nos ensinou a rezar: “Não nos deixeis cair em tentação”. Somos tentados a auto-suficiência, a duvidar do amor de Deus, a ignorar a sua presença, a orientar a vida sem a presença do Criador, ao desânimo, infidelidade, distrações, falta de espontaneidade, cansaço, aridez e inconstância. O remédio é a oração pessoal e comunitária – com fé, confiança, liberdade, humildade, determinação, disciplina, perseverança, silêncio, tempo, lugar, preparação -, pois o nosso coração deve estar em sintonia e comunhão com Aquele que é o sentido de nossa vida, o princípio e o fim de tudo. Só a Ele devemos adorar. Como Jesus, devemos fazer a vontade do Pai, sendo fiel a sua Palavra.
Também somos chamados ao jejum. Somos tentados ao consumismo, avareza, gula, vaidade, desperdício e uso desregrado das coisas. O remédio é a sobriedade, a pureza, a abstinência, a evitar o supérfluo, o respeito à vida, à liberdade, a não se conformar com a mentalidade deste mundo consumista.
A Quaresma nos chama à caridade fraterna. Somos tentados à inveja, à ira, ao preconceito, intolerância, impaciência, fechamento, indiferença. O remédio é um relacionamento fraterno, à amizade sincera, paciência, perdão, tolerância, compreensão, diálogo, respeito, cortesia, reconhecimento, solidariedade, unidade e paz.
Jesus nos ensina e nos ajuda a vencer as tentações, deixando-nos guiar pelo Espírito Santo de Deus, nosso terapeuta. Nas dificuldades, nos desertos e crises da vida, o Espírito é a nossa força e a nossa resistência contra o mal, Aquele que nos ajuda a caminhar rumo à santidade. A sua graça é maior e nenhuma tentação poderá nos separar do seu amor. É com essa confiança que devemos celebrar a Quaresma.
“Eis que vou estabelecer minha aliança convosco e com vossa descendência” (Gn 9,9). Quaresma é tempo de renovar a nossa aliança de amor com Deus. Que ele nos mostre o seu caminho e a sua estrada, que sua verdade nos oriente e nos conduza, pois é o Deus de ternura, piedade, compaixão, bondade e misericórdia e salvação, e nos dirige ao bom caminho (Sl 24 (25). Cristo já morreu, “uma vez por todas, por causa dos pecados”, para nos conduzir a Deus (1 Pd 3,18).
Ainda estão soando em nossos ouvidos as palavras da Quarta-feira de Cinzas: “Convertei-vos e crede no Evangelho”. São palavras do próprio Senhor. Portanto, o nosso caminho é a conversão interior, a penitência e a abertura ao Evangelho (Mc 1,15).
Cada um poderá refletir no seu coração: o que significa para mim a conversão e acreditar no Evangelho? Também devemos ir ao deserto de nossa existência nessa Quaresma, e com Cristo, vencer as tentações, e seguir esse caminho de santidade, pois se com ele morremos às tentações e ao pecado, “acreditamos que também viveremos com ele”, na Páscoa (Rm 6,8).